A Teresa acorda todos os dias à espera que aquele seja o dia em que tudo vai mudar. E talvez mude mesmo, não sei. Embora ela nunca o veja e todos os dias se lamente. Às vezes telefona-me, chora, chora muito. Não percebe que ontem sorriu um pouco, que hoje sorriu um pouco mais. A Teresa todos os dias leva a vida de todos os dias, no fundo acredita que é a rotina levada à risca que acabará por salvá-la. Então decidiu que se ia levantar uma hora mais cedo do que deveria, para fazer exercício. Sair um pouco para correr. Depois volta para casa, toma um banho, bebe um café em frente à televisão onde vê as notícias antes de sair para o emprego. Trabalha exactamente das nove às cinco e meia. Volta para casa, mas compra sempre fruta pelo caminho, na mercearia da Dona Aurora. Cada dia uma fruta diferente. Janta qualquer coisa, lê um pouco e vai dormir. Todos os dias a mesma coisa.
Um dia ligou-me, farta da rotina. Precisava de aventura, de paixão. Mas que não era capaz de se dar, de se deixar ir. Pediu-me que passasse por casa dela, mas que parasse pelo caminho para comprar vinho, tinto, de preferência. E que não demorasse muito. Que não conseguia estar sozinha e só queria sentir alguém.
Abriu-me a porta com o corpo despido. O olhar frágil. Tirou-me a garrafa da mão e disse-me «toma o meu corpo, que nada mais te posso dar».