Reuniu todos os dados, pegou na calculadora e, durante dias, rodeou-se de números e contas e equações. Adorava matemática, em especial o cálculo de probabilidades. Dizia que era o mais próximo que se podia chegar da prestidigitação. Cálculo após cálculo. Correlou teorias, variáveis. Zero. P sempre igual a zero. P = 0. P = Nunca. Os números não mentem, não enganam, nem tampouco conhecem a ironia. Nada houve a fazer. A Matemática nunca erra. A Matemática traçou, com precisão científica, o nosso destino. Nunca. Sem argumentação possível.
Então, porque para ela os números eram tudo, entregou-se a eles, deixou que os cálculos precisos e exactos orientassem a sua vida. Respondia com percentagens às propostas que lhe apresentavam. Nunca dizia sim ou não, respondia em probabilidades. E a nós zero. Sempre zero. Então pedi-te que recalculasses, que juntasses as variáveis da emoção. Acrescentei: o mundo é feito de impossibilidades. Tu sorriste e lançaste-te sobre a calculadora que não mentia. Adicionaste as variáveis a pedido. Mesmo assim P = 0 = nunca. Levantaste-te, desligaste a calculadora, disseste lamento, os números não mentem.
Atravessaste a sala, deixando para trás a mesa repleta de papéis preenchidos com fórmulas matemáticas, e duas ou três calculadoras. Vinhas na minha direcção quando te vi sorrir, acho que pela primeira vez te vi sorrir. Beijaste-me e voltaste a sorrir. Puseste de lado a calculadora e os números. Passaste a responder com uma incerta precisão que nem os números conseguem calcular. Descobriste nas artes uma aventura muito mais fascinante e passaste a acreditar na astrologia.