sentei-me na tua varanda sobre o mar. no início apenas explorando o teu quarto por trás do vidro, sentindo a tua casa. tentando perceber-te um pouco melhor através dos teus objectos, da maneira como os espalhas pela casa. o modo como o posicionamento de cada coisa tem uma razão de ser. as fotografias na parede milimetricamente alinhadas, a secretária perfeitamente organizada e optimizada. na mesa de cabeceira o teu diário (que apesar da curiosidade não li) e um livro de poemas, o mesmo livro de que me falas sempre que falamos de livros.
ao conhecer o teu quarto percebi que não te conheço, que não és tudo aquilo que dizes que és, que não és como eu julgo que és. agora não sei se me arrependo de ter conhecido o teu espaço e percebido que não te conheço de todo. agora não sei se quero o teu beijo. hoje, ao contrário de ontem, sei que tudo vai ser diferente, sei que não sei se estou disposto a começar tudo de novo.
insónia #1
Quando entras no bar e a vês ao longe a sorrir por ele lembras-te que não és só tu que tens um passado. E é aí que pensas que já chega, que já foi longe de mais. É aí que decides que não podes continuar assim. Fazes planos para mudar de cidade, de país e ficas no mesmo sítio porque sabes que não adianta fugir. Dizes já chega e durante dois ou três dias cumpres, não mais que isso. A necessidade de te enganares a ti mesmo é demasiado grande. Acabas por te cruzar com ela, talvez ela te telefone, e és tu quem sorris por ela. Com algo tão simples como uma qualquer piada que vos seja familiar, que te faça sempre rir. Ou talvez seja pela forma como ela pronuncia aquela palavra. O certo é que quando dás por ti, acreditas que o passado foram apenas vocês os dois, e que tudo pode voltar a ser como foi. Mas não pode. Um dia vais ter que dizer já chega e vais ter que cumprir. Mas não hoje.